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Em produção musical existe um pensamento recorrente: um disco lançado por uma banda ou um artista costuma ser o reflexo do que aconteceu durante sua produção. É possível que em cinema essa máxima também exista, mas não valeu para Mad Max: Road Fury. Após quase trinta anos, muitas adversidades e especulações, a continuação da franquia criada pelo diretor George Miller estreou em 2015, e confesso que superando as minhas expectativas, que tinham ficado bem altas com o primeiro trailer que saiu, o único que assisti até a estréia.

 

Mad Max nasceu com a minha geração, que já mencionei em outros artigos ser a geração do tempo em que Sessão da Tarde nos presenteava com grandes filmes. Foi lá que ainda criança assisti pela primeira vez “Planeta dos Macacos”, o primeirão de todos, de 1968, onde a macacada começou a nos amedrontar com um futuro "estranho", ou uma realidade paralela, ou um outro planeta, ou…? enfim, só assistindo para tirar suas conclusões. E antes que os engraçadinhos de plantão comecem a fazer piadas as custas da minha idade, é bom ficar sabendo que ouve um tempo em que filmes não vazavam na internet semanas antes de estrearem no cinema, pois ainda nem havia o vislumbre imaginativo de que teríamos algo como a internet, e os filmes chegavam aqui muitos anos depois de serem lançados em seus países de origem. Portanto, não… não assisti o filme em 1968, sou um pouco mais novo que isso.

 

Mas foi também em Sessão da Tarde que minha geração deve ter se deparado com uma trilogia revolucionária para época… Mad Max, estrelada pelo ator Mel Gibson. Estávamos no inicio da década de 80, ainda vivendo a Guerra Fria, mas que já dava seus indícios de convalescência, muito mais pela incompetência e equívocos dos governantes comunistas do que pelas virtudes do capitalismo. Mas mesmo em seu declínio a Guerra Fria ainda nos assustava com o fantasma de uma guerra nuclear, e quem não se lembra das perguntas que fazíamos: “vai ter uma terceira guerra mundial?”, "o mundo vai acabar mesmo?”, “tem algum lugar que dá para se salvar da bomba?”…! Eu fiz todas. E esse era o tom da trilogia que nos apresentava um novo subgênero da ficção científica: a Distopia, filmes onde a premissa é a seguinte: deu merda…! e agora? como vai ficar o mundo? Com essa revolução no cinema o diretor George Miler atravessou a década de 80 com seu três filmes, “Mad Max”, "Mad Max: A Caçada Continua", e “Mad Max e a Cúpula do Trovão”, redefinindo conceitos e nos dizendo que o cinema poderia ter ação e questões perturbadoras ao mesmo tempo.

 

Confesso que dos três filmes o segundo sempre foi de longe o melhor para mim, e ainda se apresenta como um dos mais importante do gênero. Mas foi… não é mais o meu preferido. Depois de “Mad Max: A Cúpula do Trovão” (1985), tinha ficado a promessa de que um quarto filme viria, mas nunca acontecia. Até que foi anunciado para 2003 o início das produções com Mel Gibson de volta ao papel de Louco Max, mas problemas de segurança na Namíbia, país escolhido para locação do filme fizeram a produção ser adiada, pois estava rolando uma guerra por lá. Mel Gibson então não quis esperar, e ao invés de ficar fugindo de “PsicoAnarcoPunks” preferiu matar jesus dirigindo “A Paixão de Cristo”, e mais uma vez tudo ficou indefinido. Finalmente, em 2009 acontece o início das produções com Tom Hardy como Max. Mas parece que os deuses do apocalipse conspiravam contra a produção pós-apocalíptica, pois até chover no deserto australiano que havia sido escolhido para ser a nova locação choveu, forçando a produção a voltar para a Namíbia. Houveram também outras tretas que poderíamos ficar aqui relatado até o fim dos tempos, mas não vale a pena.

 

Bom, apesar de tudo isso Road Fury estreou em 2015, e se tornou o meu preferido da franquia, pois conseguiu potencializar à máxima insanidade tudo aquilo que foi apresentado pelo segundo filme. Está tudo lá… a perseguição frenética, mas consistente, os PsicoAnarcoPunks que continuam ensandecidos, só que agora compreendemos o porque, e o melhor é que Miller conseguiu nos fazer compreender isso sem ficar explicando, mérito para a montagem dinâmica e precisa. E claro… eles também estão lá… os perturbadores veículos retrô-tunados, que junto com o roteiro e a direção de Miller elevam as cenas de perseguição a outro nível estético, pois o deserto se torna um palco onde a perseguição se configura em uma corografia com os carros lembrando dançarinos que nos deixam hipnotizados com seus "movimentos" e “figurinos”, criando uma beleza plástica poucas vezes vista em um filme de perseguição.                           

 

O filme já se tornou para mim uma referência de montagem precisa, pela habilidade de síntese com a qual George Miller costura vários temas sem excessos e sem deslocamentos dentro do roteiro, ele consegue dialogar a situação pós apocalíptica com o fanatismo (seita do V8) próprio de momentos distópicos e o messianismo (Immortal Joe) que utiliza fragmentos de passado (Mc Banquete, Acua-cola) para manipular gente fragilizada física e emocionalmente (a estranha febre dos War Boys, talvez consequências de uma guerra nuclear). É uma produção que nos coloca de volta nos bons filmes de perseguição de caravanas dos grandes Western, diferente das perseguições de Velozes e Furiosos, onde a ação é óbvia, tipo Zorra Total, que na primeira palavra você já sabe como vai terminar a piada.

Claro que não é só isso… o filme tem várias camadas que poderíamos ficar aqui citando durante horas… tem a jornada do herói como nas tragédias gregas retratada no War Boy Nux; a tentativa de encontrar um paraíso na terra como a Utopia (Thomas Morus) ou a terra prometida do antigo Testamento na busca da Furiosa; a construção de uma nova gênese do mundo a partir do ponto de vista feminino, se opondo ao patriarcalismo do Antigo Testamento. Se tudo isso que acredito estar lá foi deliberadamente colocado por Mark Miller eu não tenho certeza, mas acho que se assistir novamente vou ver um pouco mais naquele que já considero o melhor filme de 2015.

 

Júnior Silva não é um War Boy, mas acredita que “Testemunhou” o melhor filme de distopia já feito até hoje.

   

  

Mad Max: Road Fury, Muito Além do Deserto 

Por que o quarto filme da frnaquia de Mark Miller se tornou o filme mais relevante de 2015?

 

Júnior Silva - 22/07/2015

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