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Vontade de Fé e de Beleza

Um vídeo circula pelo youtube com uma entrevista de Rodrigo Amarante, do Los Hermanos, cedida a um repórter que insistia em querer que ele respondesse como era fazer parte de um grupo visto como “a banda da Ana Júlia”. Após se cansar de tentar convencer o jornalista (se é que se pode chamá-lo assim) de que essa imagem já não existia a muito tempo, pois a banda já havia lançado vários discos e nem os fãs se lembravam mais da música, Amarante diz ao repórter que, achar que Los Hermanos ainda era a “banda da Ana Júlia” seria coisa de um jornalismo preguiçoso como o dele.

 

Mês passado tivemos uma prova do que Amarante falou, no sentido de que a imprensa brasileira teria muito o que mostrar, se procurasse direito. Foi lançado no Teatro Carlos Gomes, em Vitória, o disco do grupo capixaba Pó de Ser Emoriô, primeiro álbum homônimo do grupo de quatro amigos que se uniram em 2011 para dar corpo e alma a uma sintonia que já acontecia antes de maneira dionisiacamente despretensiosa.

 

Como eles mesmos definem, o grupo seria um encontro das referências setentistas deles com a musicalidade afro-brasileira. E é isso que se percebe escutando o disco e assistindo ao show do grupo. Força rítmica e cênica produzem uma comovente reverberação de sentimentos conflitantes. Espanto (A Urso), melancolia (Mariposa), medo seguido de uma vontade de loucura (Só Para Loucos) , comoção (Sopra-me a Ilha), religiosidade (Cê Tem Fé Em Que) e desejo de fazer parte daquilo que parece tão etéreo e ao mesmo tempo tão imanente às questões que fazem parte do nosso tempo (Quilombo Pós-Moderno).

 

O disco foi produzido por Sergio Benevenuto, com um currículo de muitos trabalhos relevantes na música brasileira e que conseguiu moldar no álbum uma síntese muito sincera do que a música do grupo propõe em seu encontro da religiosidade afro-brasileira e as referências que cada um dos quatro “emoriôs” traz em suas vontades de beleza e fé.

 

Com certeza não existirá uma unanimidade sobre o grupo, assim como Los Hermanos e qualquer outro grupo não o são, mas a entrevista de Amarante traz uma reflexão que no mínimo merece ser colocada... por que o jornalismo brasileiro sofre dessa preguiça crônica em dar visibilidade somente aquilo que já esta sendo visto? O trabalho de grupos como Pó de Ser Emoriô estão por aí, e existe uma sociedade que precisa conhecer essa arte, mas é privada por um jornalismo que é no mínimo desatento.

 

P.S. Júnior Silva não é louco e religioso... até escutar Pó de Ser Emorió.

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